Funções Executivas no TDAH

A importância das funções executivas nos paceintes com TDAH.

ATENÇÃO, MEMÓRIA E FUNÇÕES COGNITIVAS

Neuropsicólogo Mauricio Maluf Barella CRP 06/178046

12/15/20255 min ler

As funções executivas (FEs) constituem um conjunto de habilidades cognitivas de ordem superior que têm como principal objetivo organizar o comportamento dirigido a metas, regulando ações, pensamentos e emoções. São frequentemente descritas como o “sistema de gestão” do cérebro, uma metáfora que remete à sua função central: supervisionar, planejar e ajustar comportamentos em tempo real, diante das demandas ambientais e dos objetivos internos.

Esse sistema atua como um “CEO” do cérebro, sendo essencial para atividades como tomar decisões, resistir a impulsos inadequados, adiar recompensas, mudar de estratégia e manter o foco mesmo diante de distrações. O seu bom funcionamento é indispensável para a adaptação em contextos sociais, escolares e profissionais.

Principais Componentes das Funções Executivas

As funções executivas envolvem várias sub-habilidades interdependentes:

  1. Planejamento: a capacidade de organizar mentalmente etapas e recursos para alcançar um objetivo.

  2. Organização: relacionada à ordenação e categorização de informações, ideias ou ações.

  3. Monitoramento: envolve a verificação contínua do desempenho em uma tarefa, com ajustes conforme necessário.

  4. Flexibilidade cognitiva: permite alternar entre tarefas, adaptar-se a mudanças ou rever estratégias diante de erros ou imprevistos.

  5. Controle inibitório: a habilidade de controlar impulsos, interromper comportamentos automáticos e resistir a distrações.

Essas funções não operam isoladamente. Juntas, elas regulam o comportamento propositado, sendo particularmente essenciais em contextos que exigem autorregulação, como resolver problemas, cumprir prazos ou lidar com frustrações.

Funções Executivas e Transtornos do Neurodesenvolvimento

No campo clínico, as disfunções executivas são um dos alvos principais de investigação, especialmente em casos de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Transtornos do Espectro Autista, e outros transtornos do neurodesenvolvimento. Crianças e adultos com TDAH, por exemplo, frequentemente “sabem o que precisam fazer, mas não conseguem fazer” – um fenômeno que não é explicável apenas pela desatenção ou pela impulsividade, mas por déficits nos processos de regulação executiva.

A dificuldade em iniciar tarefas, procrastinar mesmo diante de motivação intrínseca ou extrínseca, e a incapacidade de finalizar atividades, são todos sintomas relacionados à disfunção executiva. Por isso, durante a avaliação neuropsicológica, o rastreio das funções executivas é um dos domínios mais informativos e relevantes para a compreensão do funcionamento cognitivo e comportamental global do indivíduo.

O Sistema de Gestão do Comportamento

O termo “sistema de gestão do comportamento”, amplamente usado em neuropsicologia aplicada, representa a função reguladora das FEs. Ele se refere à capacidade do indivíduo de avaliar metas, inibir ações ineficazes, persistir diante de desafios e ajustar sua conduta ao longo do tempo. Esse sistema também compreende o gerenciamento emocional, ou seja, o modo como emoções interferem ou são controladas durante a execução de tarefas.

Importante destacar que esse sistema é altamente dependente de três regiões cerebrais:

  • Córtex pré-frontal dorsolateral: associado ao planejamento, tomada de decisão e manutenção de metas.

  • Córtex orbitofrontal: envolvido na regulação emocional e tomada de decisões com base em recompensas e punições.

  • Córtex cingulado anterior: atua na detecção de erros e no monitoramento de conflitos.

Danos ou atrasos no desenvolvimento dessas áreas impactam diretamente a capacidade do indivíduo de se autorregular e responder de forma adaptativa aos ambientes escolares, familiares e sociais.

Disfunções Executivas na Vida Cotidiana

As disfunções executivas não se manifestam apenas em testes estruturados. Elas têm expressiva relevância clínica e funcional, pois se traduzem em comportamentos do dia a dia. Entre os sinais clínicos observados estão:

  • Dificuldade em manter rotinas e horários.

  • Problemas em seguir instruções multietapas.

  • Baixa tolerância à frustração e impulsividade verbal.

  • Tendência à desorganização e ao esquecimento de compromissos.

  • Falta de insight sobre erros cometidos.

Esses sinais podem ser observados mesmo em indivíduos com inteligência média ou superior. Isso explica por que muitas pessoas com TDAH, por exemplo, apresentam desempenho acadêmico abaixo do esperado: não é uma questão de capacidade, mas de autorregulação.

Avaliação Neuropsicológica das Funções Executivas

A avaliação das FEs é um componente crucial do processo diagnóstico em neuropsicologia. Diversos instrumentos são utilizados, como:

  • Testes de Fluência Verbal (FAS, animais) – avaliam a flexibilidade cognitiva, planejamento e acesso lexical.

  • Stroop Test – testa controle inibitório e atenção seletiva.

  • Torre de Londres / Torre de Hanoi – medem planejamento e solução de problemas.

  • Wisconsin Card Sorting Test (WCST) – avalia flexibilidade cognitiva e estratégias adaptativas.

Além disso, entrevistas clínicas, questionários comportamentais (como o BRIEF ou o DEX) e observações ecológicas fornecem uma visão mais ampla e contextualizada.

A Intervenção: Estímulo e Treino das Funções Executivas

Compreender que as FEs são plásticas e sensíveis a intervenções é um dos avanços mais promissores da neuropsicologia contemporânea. Intervenções baseadas em treinamento cognitivo, adaptação de rotinas e suporte psicopedagógico podem melhorar significativamente o desempenho funcional, mesmo diante de déficits persistentes.

Algumas estratégias incluem:

  • Uso de checklists visuais e agendas estruturadas.

  • Estabelecimento de recompensas imediatas e concretas.

  • Treino específico de início e finalização de tarefas.

  • Técnicas de regulação emocional, como mindfulness e reestruturação cognitiva.

A presença de um ambiente estruturado, previsível e com reforço positivo frequente é altamente benéfico, especialmente para crianças.

Conclusão

As funções executivas são o eixo central do comportamento intencional. Elas regulam desde ações simples, como organizar o material escolar, até processos mais complexos, como planejar o futuro ou resolver conflitos sociais. Sua disfunção pode comprometer significativamente a autonomia, o desempenho acadêmico e o bem-estar emocional.

Entender as FEs como um sistema de gestão do comportamento ajuda a integrar aspectos cognitivos, emocionais e comportamentais dentro de uma mesma estrutura conceitual. Na prática clínica, esse entendimento fundamenta decisões diagnósticas e interventivas mais precisas e personalizadas.

Como sempre, é essencial lembrar que a interpretação dos dados e a definição de diagnósticos devem ser feitas exclusivamente por profissionais licenciados e especializados em neuropsicologia.

Referências

American Psychiatric Association. (2022). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5-TR (Texto revisado). Associação Americana de Psiquiatria.
(Tradução automática do inglês)

Fonseca, R. P. (2023). O papel das funções executivas. Revista Neuroeducação, 42–43.
Disponível em: [Revista Neuroeducação]

Oliveira, R. M., Mograbi, D. C., & Charchat-Fichman, H. (2016). Normative data and evidence of validity for the Rey Auditory Verbal Learning Test, Verbal Fluency Test, and Stroop Test with Brazilian children. Psychology & Neuroscience, 9(1), 54–67. https://doi.org/10.1037/pne0000041

Riccio, C. A., Sullivan, J. R., & Cohen, M. J. (2010). Neuropsychological assessment and intervention for childhood and adolescent disorders. John Wiley & Sons.
(Capítulo sobre TDAH e funções executivas)

Cosenza, R. M. (2020). Neurociência e mindfulness: Meditação, equilíbrio e saúde mental. ElloCursos Psicologia.
(Discussão sobre regulação emocional e autorregulação)

Barella, M. M. (2024). Laudo de avaliação neuropsicológica: Alexandre da Silva Nogueira (8 anos). Clínica de Psicologia SP.
(Dados clínicos sobre impacto funcional das FEs no TDAH)

APA Style Blog. (2020). How to cite the DSM–5 in APA Style (7th ed.). American Psychological Association.
https://apastyle.apa.org