Desenvolvimento Infantil

Um Pilar para Compreensão Diagnóstica no TDAH

O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é, por definição nos manuais diagnósticos internacionais, um transtorno do neurodesenvolvimento com início na infância. Segundo o DSM-5-TR, os sintomas devem estar presentes antes dos 12 anos de idade, ainda que possam se tornar evidentes apenas em estágios posteriores da vida. Isso reforça a necessidade de uma reconstrução detalhada da trajetória desenvolvimental da criança — inclusive quando a avaliação é feita já na adolescência ou na vida adulta.

Nesse sentido, a avaliação do desenvolvimento infantil não é apenas uma etapa da anamnese, mas sim um eixo integrador para a análise da sintomatologia atual. Investigar a aquisição precoce de habilidades como linguagem, coordenação motora, adaptação escolar, padrões atencionais e de autorregulação emocional permite distinguir entre manifestações persistentes do neurodesenvolvimento e alterações secundárias a fatores ambientais, como traumas, negligência ou doenças médicas.

Por exemplo, atrasos significativos na linguagem receptiva ou expressiva podem coexistir com comportamentos hiperativos e impulsivos, mas não necessariamente indicar TDAH. Em contrapartida, dificuldades de autorregulação observadas desde os primeiros anos, com manutenção do padrão ao longo do desenvolvimento, tendem a refletir disfunções mais estruturais nos circuitos de atenção e inibição comportamental.

A observação dos marcos do desenvolvimento motor também é essencial. Alterações em tônus, equilíbrio, coordenação fina e global, muitas vezes desconsideradas, podem ser indicativas de uma imaturidade neurofuncional associada ao TDAH. Estudos têm evidenciado que déficits em funções motoras precoces estão associados a prejuízos na autorregulação e no funcionamento executivo futuro.

Além disso, a adaptação escolar inicial é uma janela crítica. Crianças com TDAH frequentemente apresentam dificuldades em seguir instruções, manter-se sentadas e completar tarefas desde os primeiros anos escolares. Esses sinais, quando consistentes e presentes em múltiplos contextos (casa, escola, atividades sociais), corroboram para o diagnóstico diferencial frente a comportamentos reativos ou contextualmente mediados.

A avaliação retrospectiva do desenvolvimento, portanto, não é apenas informativa, mas diagnóstica. Ela fornece a coerência temporal necessária para a identificação de um padrão contínuo de dificuldades, conforme exigido pelos critérios nosológicos. Em adultos, por exemplo, essa reconstrução é vital para evitar superdiagnósticos baseados em queixas contemporâneas de desatenção, muitas vezes secundárias a estresse ou esgotamento mental.

Além disso, compreender o desenvolvimento infantil permite adaptar estratégias terapêuticas e educacionais às necessidades específicas de cada criança. Isso é particularmente importante em casos complexos, como o de Francisco, uma criança de 5 anos cuja avaliação neuropsicológica revelou dificuldades persistentes de engajamento e atenção, compatíveis com queixas relatadas por profissionais de diferentes áreas .

A análise do desenvolvimento infantil permite compreender a origem e a persistência de dificuldades em atenção, funcionamento acadêmico e comportamento. Associar esses dados ao histórico familiar e organizá-los em um rastreio clínico fortalece a coerência temporal da investigação.

Referências

• American Psychiatric Association. (2022). DSM-5-TR – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, Revisão de Texto.

• Yates, D. B., Silva, M. A., & Bandeira, D. R. (2019). Avaliação psicológica e desenvolvimento humano: Casos clínicos.

• Riccio, C. A., Sullivan, J. R., & Cohen, M. J. (2010). Neuropsychological Assessment and Intervention for Childhood and Adolescent Disorders.

• Manual Clínico do Transtorno de Déficit de Atenção / Hiperatividade. (2005). Camargos, W. Jr. & Hounie, A. G. (Eds.).

• Laudo de Avaliação Neuropsicológica – Francisco Carvalho .

• ElloCursos (2020). Desenvolvimento e Estimulação.

• Riccio et al. (Capítulo 6: Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder). In Neuropsychological Assessment and Intervention for Childhood and Adolescent Disorders.