A Memória no TDAH
Aspectos da memória nos pacientes dom TDAH
Neuropsicólogo Mauricio Maluf Barella CRP 06/178046
12/15/20255 min ler


A memória funcional, também conhecida como memória de trabalho, é um componente central das funções executivas. Ela permite que informações sejam mantidas e manipuladas temporariamente durante tarefas cognitivas complexas, como a resolução de problemas, o raciocínio e a compreensão de instruções. No cotidiano, é essa capacidade que nos permite lembrar de um número de telefone enquanto o discamos, seguir uma receita de cozinha, ou completar uma tarefa com múltiplos passos.
No Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), indivíduos frequentemente relatam queixas de memória, como esquecimentos frequentes e dificuldades para manter informações ativas na mente. No entanto, tais dificuldades geralmente não configuram um transtorno amnéstico clássico, como ocorre em quadros neurológicos ou demenciais. Em vez disso, elas refletem limitações específicas em componentes da memória funcional e executiva, especialmente a manutenção ativa de informações, a recuperação sob distração e a organização eficiente do material mental.
O que é Memória Funcional?
A memória funcional refere-se à capacidade de manter e manipular informações por um curto período de tempo, sendo essencial para o comportamento dirigido a objetivos. Baddeley e Hitch (1974) propuseram um modelo teórico influente, composto por três componentes principais: o executivo central (responsável pelo controle atencional), o laço fonológico (para armazenamento verbal) e a alça visuoespacial (para material visual e espacial). Posteriormente, Baddeley (2000) adicionou um quarto componente, o buffer episódico, que integra informações de diferentes fontes em uma representação multidimensional.
Esse sistema é especialmente exigido em situações em que o indivíduo precisa realizar várias tarefas simultaneamente, resistir a distrações ou tomar decisões rápidas. Em adultos e crianças com TDAH, esse sistema tende a ser menos eficiente, o que contribui para prejuízos funcionais significativos.
TDAH e Memória Funcional
O TDAH é caracterizado por sintomas persistentes de desatenção, hiperatividade e impulsividade, que interferem no funcionamento ou desenvolvimento do indivíduo. De acordo com o DSM-5-TR, déficits na atenção sustentada, na regulação emocional e nas funções executivas são comuns. Entre as funções executivas mais afetadas está a memória funcional.
Indivíduos com TDAH frequentemente relatam:
Dificuldade em seguir instruções longas ou sequenciais;
Esquecimento de compromissos ou tarefas escolares;
Perda frequente de objetos (como chaves ou materiais escolares);
Esquecimento de informações recém-aprendidas;
Dificuldade para manter o foco em atividades que exigem planejamento.
Esses sintomas são frequentemente confundidos com distúrbios de memória mais graves. No entanto, estudos mostram que, na maioria dos casos, as dificuldades estão relacionadas a falhas nos sistemas de atenção e regulação executiva e não a disfunções estruturais do hipocampo, que caracterizam os transtornos amnésticos verdadeiros.
Evidências Neuropsicológicas
Diversos estudos têm demonstrado que indivíduos com TDAH apresentam desempenho inferior em tarefas que envolvem memória de trabalho, como o teste de dígitos (digit span), tanto na ordem direta quanto inversa. Além disso, testes como a Tarefa de Stroop, o Teste de Fluência Verbal e a Torre de Londres também revelam prejuízos na capacidade de planejamento, inibição e controle da interferência – todos correlacionados à memória funcional e à regulação da atenção.
Segundo Riccio et al. (2010), a memória funcional é uma ponte entre a atenção e a execução do comportamento adaptativo, sendo essencial para o funcionamento escolar, social e emocional. A falha nesse sistema gera uma cascata de efeitos negativos no desempenho cotidiano, como dificuldade em concluir tarefas, manter o foco e seguir rotinas.
Implicações no Cotidiano
O impacto das limitações da memória funcional no dia a dia é significativo. Crianças com TDAH podem ter dificuldades para se lembrar de instruções dadas em sala de aula, o que compromete o aprendizado. Adultos podem perder prazos importantes ou esquecer compromissos, afetando sua vida profissional e social.
Essas dificuldades não são apenas cognitivas, mas também emocionais. A frustração com os esquecimentos constantes, somada às críticas externas, pode levar à baixa autoestima, ansiedade e até depressão. Assim, o comprometimento da memória funcional em indivíduos com TDAH está fortemente ligado ao funcionamento global da personalidade e qualidade de vida.
Avaliação e Intervenção
A avaliação neuropsicológica é fundamental para distinguir se os esquecimentos referidos estão associados a disfunções executivas (como no TDAH) ou a quadros neurológicos mais graves (como as demências). Instrumentos como o WISC-IV/WAIS, a Bateria NEUPSILIN, o RAVLT e o Teste de Extensão de Dígitos são úteis para identificar o perfil de funcionamento cognitivo.
Na intervenção, estratégias psicoeducacionais e terapias cognitivo-comportamentais são recomendadas. Técnicas de organização externa (uso de agendas, lembretes, checklists) podem compensar falhas de memória funcional. Programas baseados em mindfulness também têm mostrado resultados promissores no fortalecimento das redes de atenção e regulação emocional.
Além disso, programas de treinamento de funções executivas, jogos de memória e exercícios de raciocínio lógico podem promover ganhos significativos na capacidade de manter e manipular informações, especialmente se iniciados na infância.
Considerações Finais
A memória funcional é uma função cognitiva crítica para a adaptação ao ambiente e para a execução eficaz das atividades do dia a dia. No TDAH, os prejuízos não refletem necessariamente um transtorno de memória tradicional, mas sim um déficit na capacidade de manter e manipular informações sob interferência e distrações.
A compreensão desse aspecto é crucial para uma intervenção adequada, que não foque apenas no conteúdo mnemônico, mas nas condições cognitivas que permitem o uso eficaz da memória. Identificar se os esquecimentos derivam de falhas atencionais e executivas — e não de comprometimento neurológico — é uma tarefa que exige avaliação clínica detalhada por profissionais qualificados.
O manejo adequado dos sintomas de TDAH e suas implicações na memória funcional requer uma abordagem multidisciplinar, envolvendo pais, professores, psicólogos, psiquiatras e neuropsicólogos. Assim, é possível minimizar os impactos do transtorno e maximizar a qualidade de vida e o desempenho cotidiano do indivíduo.
As queixas de memória no TDAH costumam estar mais relacionadas a falhas de atenção e funções executivas do que a transtornos amnésticos propriamente ditos. A qualidade do sono também influencia diretamente a capacidade de manter e recuperar informações no dia a dia.
Referências
American Psychiatric Association. (2022). DSM-5-TR: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – Texto Revisado.
Baddeley, A. D. (2000). The episodic buffer: A new component of working memory? Trends in Cognitive Sciences, 4(11), 417–423.
Riccio, C. A., Sullivan, J. R., & Cohen, M. J. (2010). Neuropsychological Assessment and Intervention for Childhood and Adolescent Disorders.
Oliveira, R. M., Mograbi, D. C., & Charchat-Fichman, H. (2016). Normative Data and Validity for the RAVLT and Verbal Fluency Tests in Brazilian Children.
Camargos, W., & Hounie, A. G. (2005). Manual Clínico do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade.
Fonseca, R. P. (2019). O papel das funções executivas no desempenho acadêmico. Revista Neuroeducação.
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