Hiperatividade no TDAH adulto

O papel da hiperatividade no rastreio de sintomas do tdah

Neuropsicólogo Mauricio Maluf Barella CRP 06/178046

12/15/20255 min ler

hiperatividade infantil no TDAH
hiperatividade infantil no TDAH

A hiperatividade é tradicionalmente concebida como uma condição da infância, caracterizada por comportamentos excessivamente agitados, impulsividade motora e dificuldade de permanecer sentado por longos períodos. No entanto, uma compreensão mais abrangente e atualizada revela que essa manifestação é apenas uma das possíveis expressões do fenômeno, o qual pode assumir formas mais sutis e internalizadas ao longo do desenvolvimento humano, especialmente na adolescência e vida adulta.

1. O constructo da hiperatividade

Segundo o DSM-5-TR, a hiperatividade é um dos critérios centrais do Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), juntamente com a desatenção e a impulsividade. Na infância, a hiperatividade tende a ser observável em comportamentos como correr ou subir em móveis excessivamente, falar sem parar ou ter dificuldade para engajar-se em atividades silenciosas. Todavia, com o amadurecimento do sistema nervoso central e a crescente demanda social por autorregulação, tais comportamentos podem dar lugar a manifestações internalizadas, como inquietação mental, sensação de estar constantemente "ligado" e dificuldade para relaxar.

2. A neurobiologia da hiperatividade

A hiperatividade está fortemente associada a disfunções nos circuitos frontoestriatonigrais, que envolvem o córtex pré-frontal, o corpo estriado e regiões subcorticais reguladas por neurotransmissores como a dopamina e a noradrenalina. Estudos de neuroimagem demonstram que crianças e adultos com sintomas hiperativos frequentemente apresentam hipoativação dessas áreas durante tarefas que exigem controle inibitório, planejamento e atenção sustentada.

Além disso, os ritmos cerebrais anômalos, particularmente no eletroencefalograma (EEG), evidenciam a presença de padrões de alta ativação cortical em repouso, os quais estão correlacionados com a sensação contínua de urgência interna. Essa hiperativação basal pode explicar por que muitos indivíduos relatam a necessidade constante de estímulo e movimento, mesmo na ausência de fatores externos.

3. Hiperatividade na adolescência e vida adulta

Na adolescência, a hiperatividade manifesta-se, com frequência, sob a forma de impulsividade verbal, dificuldade de manter o foco em atividades escolares ou acadêmicas, mudança constante de interesses e dificuldades em ambientes estruturados. Já em adultos, o quadro é ainda mais complexo: pode incluir pensamentos acelerados, sensação de inquietação constante, procrastinação, dificuldade em finalizar tarefas e padrões de sono desregulados.

Adultos hiperativos raramente demonstram comportamentos motores exacerbados como os observados em crianças. Em vez disso, são comuns as queixas subjetivas de agitação interna, impulsividade em decisões financeiras ou relacionais e fadiga mental associada à sobrecarga cognitiva. Tais aspectos tornam o diagnóstico mais desafiador, pois exigem uma escuta clínica atenta e o uso de instrumentos de avaliação psicométrica adequados.

4. A avaliação neuropsicológica da hiperatividade

A avaliação da hiperatividade deve ser multidimensional. Em contextos clínicos, a análise deve ir além da observação comportamental direta. A utilização de instrumentos padronizados, como a Conners’ Adult ADHD Rating Scales (CAARS), Teste de Atenção por Cancelamento e tarefas de Stroop, permite identificar dificuldades em manter a atenção, controlar impulsos e gerenciar múltiplas tarefas, todas frequentemente impactadas pela hiperatividade.

A anamnese detalhada, aliada à aplicação de inventários comportamentais e entrevistas estruturadas, permite traçar um panorama funcional da manifestação da hiperatividade, levando em consideração sua interferência na rotina diária, relações interpessoais e bem-estar emocional.

5. Interferências funcionais da hiperatividade

Quando não adequadamente identificada e tratada, a hiperatividade pode interferir de maneira significativa na qualidade de vida do indivíduo. Entre as principais repercussões, destacam-se:

  • Dificuldade de concentração: a busca constante por estímulos externos leva à fragmentação da atenção e à dificuldade de manter o foco por longos períodos, impactando negativamente o desempenho escolar, acadêmico ou profissional.

  • Alterações no sono: a hiperatividade mental pode resultar em insônia de iniciação ou de manutenção, visto que o indivíduo relata não conseguir "desligar a mente" ao deitar-se.

  • Exaustão mental: a constante estimulação, mesmo que inconsciente, exige recursos atencionais e cognitivos elevados, levando à fadiga mental e à diminuição da capacidade de autorregulação emocional.

6. A importância do rastreio e da contextualização clínica

A hiperatividade não deve ser analisada de forma isolada. No contexto neuropsicológico, é essencial avaliá-la em conjunto com outros domínios, como atenção sustentada, memória operacional, funções executivas e regulação emocional. Essa abordagem integrada evita interpretações reducionistas e estigmatizantes, permitindo uma compreensão mais acurada do funcionamento global do indivíduo.

Além disso, fatores contextuais como ambiente familiar, demandas acadêmicas e histórico de adversidades psicossociais devem ser cuidadosamente considerados. Crianças e adolescentes em contextos de vulnerabilidade podem expressar agitação como resposta ao estresse, o que não necessariamente configura um quadro clínico de hiperatividade.

7. Estratégias de intervenção

O manejo clínico da hiperatividade envolve estratégias psicoterapêuticas, psicoeducacionais e, em alguns casos, farmacológicas. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é amplamente recomendada, especialmente em adultos, por favorecer o desenvolvimento de habilidades de autorregulação, reestruturação cognitiva e planejamento.

Intervenções baseadas em mindfulness também têm demonstrado eficácia, ao promoverem a consciência do momento presente e a redução da reatividade impulsiva, contribuindo para o equilíbrio neurofuncional dos circuitos corticais envolvidos na hiperatividade.

Para crianças, programas de treinamento parental, aliados à adaptação escolar e ao uso de reforço positivo, têm apresentado resultados promissores na diminuição dos comportamentos hiperativos e no aumento do autocontrole.

Considerações finais

A hiperatividade, ao contrário do estereótipo frequentemente associado à infância, é um fenômeno neurocomportamental que pode persistir ao longo da vida, manifestando-se de formas diversas e impactando múltiplas esferas da funcionalidade. Reconhecê-la em sua complexidade é fundamental para uma avaliação clínica ética, empática e tecnicamente fundamentada.

A análise cuidadosa desse domínio, dentro de uma abordagem neuropsicológica abrangente, contribui para intervenções mais precisas e eficazes, promovendo o bem-estar e a inclusão do indivíduo em sua totalidade. Como sempre, é essencial lembrar que diagnósticos e intervenções devem ser realizados exclusivamente por profissionais qualificados e devidamente habilitados.

Na adolescência e vida adulta, a hiperatividade tende a se manifestar de forma mais interna, como inquietação mental e dificuldade de relaxar, afetando a atenção, o sono e a regulação emocional. Avaliar esses padrões em conjunto é essencial para evitar interpretações estereotipadas.

Referências

  1. American Psychiatric Association. (2022). Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-5-TR.

  2. Camargos Jr., W. & Hounie, A. G. (2005). Manual Clínico do Transtorno de Déficit de Atenção / Hiperatividade.

  3. Riccio, C. A., Sullivan, J. R., & Cohen, M. J. (2010). Neuropsychological Assessment and Intervention for Childhood and Adolescent Disorders.

  4. Yates, D. B., Silva, M. A., & Bandeira, D. R. (2019). Avaliação Psicológica e Desenvolvimento Humano: Casos Clínicos.

  5. Oliveira, M., Mograbi, D. C., & Charchat-Fichman, H. (2016). Normative Data and Validity for Rey Auditory Verbal Learning Test and Stroop Test with Brazilian Children.